Linguagem Coloquial e Culta

O “CERTO” E O “ERRADO” NO USO DA LÍNGUA

“Ta na cara que eles não teve peito de encará os ladrão.”(1)

“Obviamente faltou-lhes coragem para enfrentar os ladrões”.(2)

      Qual delas é gramaticalmente correta? Não há dúvidas que é a frase 2. Mas, se tanto a frase 2 quanto a frase 1 dizem a mesma coisa, se qualquer pessoa que seja falante do nosso idioma pode entende-las perfeitamente, por que então se considera correta a frase 2 e errada a frase 1?
      Ou seja, que critérios são usados para determinar o que é certo e o que é errado dentro de um mesmo idioma?
      De modo geral, os falantes são levados a aceitar como “correto” o modo de falar do segmento social que, em conseqüência de sua privilegiada situação econômica e cultural, tem maior prestigio dentro da sociedade. Assim, o modo de falar desse grupo social passa a servir de 
padrão, enquanto as demais variedades lingüísticas, faladas por grupos sociais menos prestigiados, passam a ser consideradas “erradas”.
      É importante entender que, a principio, não existe uma forma melhor (“mais cera”) ou pior (“mais errada”) de se falar. Trata-se apenas de uma diferenciação que se dá baseada em critérios sociais e também em situação de uso efetivo da língua.
Uma das funções da escola é, através do ensino de língua portuguesa, oferecer a você condições de dominar a norma-padrão, a fim de que, nas circunstâncias sociais convenientes, seja falando, seja escrevendo, você possa utiliza-la adequadamente.


LÍNGUA CULTA E LÍNGUA COLOQUIAL

      Já vimos que, convencionalmente, considera-se como “correta” a língua utilizada pelo grupo de maior prestigio social. Essa é a chamada língua culta, falada escrita, em situações formais, pelas pessoas de maior instrução. A língua culta é nivelada, padronizada, principalmente pela escola e obedece à gramática da língua-padrão.
      A língua coloquial, por outro lado, é uma variante espontânea, utilizada, mas relações informais entre dois ou mais falantes. É a língua do cotidiano, sem muita preocupação com as normas. O Falante, ao utiliza-la, comete deslizes gramaticais com freqüência considerável. Outra característica da língua coloquial é o uso de constantes de expressões populares, frases feitas, gírias etc. Fazendo uma comparação entre a 
língua culta e a língua coloquial, é possível constatar que, em certos aspectos, as diferenças entre as duas são bastante evidentes, mas, em outros, os limites não são tão claros, ficando difícil, nesses casos, definir uma “fronteira” entre o que é culto e oi que é coloquial.
      No quadro que segue, estão as diferenças que mais facilmente podem ser observadas:

USO COLOQUIAL/POPULAR
USO CULTO
Pronuncia mais descuidada de certas palavras e expressões: nóis, oceis, tá bão, num vô, num quêMaior cuidado com a pronúncia: nóis, vocês, está bom, não vou, não quer.
Não utilização das marcas de concordânci.a Ex: Os meninos vai/vão bem.Uso regular da forma nós.
Uso constante de a gente no lugar de nós.Raro uso dessas expressões.
Mistura de pessoas gramaticais. Ex: Você sabe que te enganam.Uniformidade no uso das pessoas gramaticais.Ex: Você sabe que o enganam. Tu sabes que te enganam.
Uso “livre” da flexão dos verbos. Ex: Se ele fazer; enganam.Utilização da flexão verbal conforme as normas gramaticais. Ex: Se ele fizer, se ele puser.
Uso de gírias.Não utilização de gírias.

TEXTO 3

      Se utilizássemos numa conversa com homens medievais a expressão Idade Média, eles não teriam idéia do que isso poderia significar. Eles, como todos os homens de todos períodos históricos, se viam vivendo na época contemporânea. De fato, falarmos em Idade Média representa uma rotulação a posteriori, uma satisfação da necessidade de dar nome aos momentos passados. No caso do que chamamos de Idade Média, foi o século XVI que elaborou tal conceito. Ou melhor, tal preconceito, pois o termo expressava um desespero indisfarçado pelos séculos localizados entre a Antiguidade Clássica e o próprio século XVI.

VAMOS ACABAR COM ESSE FOLGA

      O Negócio aconteceu num café. Tinha uma porção de sujeitos, sentados nesse café, tomando umas e outras. Havia brasileiros, portugueses, franceses, argelinos, alemães, o diabo.
      De repente , um alemão forte pra cachorro levantou e gritou que não via homem pra ele ali dentro. Houve a surpresa inicial, motivada pela provocação, e logo um turco, tão forte como o alemão, levantou-se de lá e perguntou:
      - Isso é comigo?
      - Pode ser com você também – respondeu o alemão.

      Ai então o turco avançou para o alemão e levou uma traulitada tão segura que caiu no chão. Vai daí o alemão repetiu que não havia homem ali dentro pra ele. Queimou-se então um português que era maior ainda do que o turco. Queimou-se e não conversou. Partiu para cima do alemão e não teve outra sorte. Levou um murro debaixo dos queixos e caiu sem sentidos.
      O alemão limpou as mãos, deu mais um golpe no chope e fez ver aos presentes que o dizia era certo. Não havia homem para ele naquele café. Levantou-se então um inglês troncudo pra cachorro e também entrou bem. E depois do inglês foi a vez de um francês, depois um norueguês etc.etc. Até que, lá do canto do café, levantou-se um brasileiro magrinho, cheio de picardia, para perguntar, como os outros:
      - Isso é comigo?

      O alemão voltou a dizer que podia ser. Então o brasileiro deu um sorriso cheio de bossa e veio vindo gingando assim pro lado do alemão. Parou perto, balançou o corpo e ... pimba! O alemão deu-lhe uma porrada na cabeça com tanta força que quase desmonta o brasileiro.
      Como, minha senhora? Qual é o fim da história? Pois a história termina aí, madame. Termina ai que é pros brasileiros perderem essa mania de pisar macio e pensar que são malandros do que os outros.
(Stanislau Ponte Preta, Dois amigos e uma chato,São Paulo, Moderna, 1986.)

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